Hospitais que atendem ao SUS não terão que cumprir metas

Foi publicado hoje no Diário Oficial da União a Lei nº 13.992/20, que dispõe sobre a suspensão por 120 (cento e vinte) dias, a contar de 1º de março do corrente ano, da obrigatoriedade da manutenção das metas quantitativas e qualitativas contratualizadas pelos prestadores de serviço de saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde de forma a lhes garantir os repasses dos valores financeiros contratualizados em sua integralidade.

A referida lei também regula a manutenção do pagamento da produção do Fundo de Ações Estratégicas e Compensação (Faec), com base na média dos últimos 12 (doze) meses.

Segundo o diploma legal em análise, as instituições devem, portanto, buscar junto aos seus gestores públicos contratantes a concretização do pagamento integral dos valores previstos em contrato para média e alta complexidade, de forma retroativa ao mês de março, e, ainda, da média da produção de serviços financiados pelo Fundo de Ações Estratégicas e Compensação, de acordo com a produção registrada em 2019.

Cumpre destacar ainda que, segundo a Portaria GM/MS nº 662/20 de 1º de abril de 2020, a gestão nacional do SUS garantiu a transferência de recursos financeiros aos fundos dos estados, Distrito Federal e municípios do MAC – Grupo de Atenção da Média e Alta Complexidade, na mesma lógica de transferências regular e automática, independente da produção aprovada e registrada nos sistemas de informações, ou seja, afastando-se o risco de suspensão de transferências fundo a fundo por redução da produção de serviços.

Ademais, a portaria 662/20 também já previa a garantia de repasses aos entes públicos dos recursos do FAEC, tendo como fundamento a série histórica do segundo semestre de 2016. É preciso ressaltar que a portaria em questão teve como principal finalidade regular e garantir os repasses fundo a fundo, evitando-se perdas por queda na produção de serviços. Já a Lei 13.992/20 tratou da regulação da relação jurídica entre os gestores públicos e os prestadores de serviços ao SUS, de forma a garantir o recebimento de recursos mesmo diante da suspensão das metas originalmente contratadas e que serviram de parâmetros para a definição dos recursos financeiros.

Diante desse cenário normativo, ajustes contratuais entre gestores e as entidades prestadores de serviços poderão ser necessários, para garantir que metas quantitativas e qualitativas anteriormente estabelecidas sejam adequadas às demandas relativas ao enfrentamento da pandemia, sem prejuízo da garantia dos recursos financeiros inicialmente pactuados diante dos comandos insertos na  Lei 13.992/20. Sem dúvida umas das principais metas na atualidade é manter as estruturas de prontidão e à espera dos pacientes e, por outro lado, envidar todos os esforços junto a sociedade para que a doença não avance e o atendimento não se faça necessário.

Saliente-se que a normatização já existente no âmbito do Ministério da Saúde desde a edição do Programa de Contratualização e Reestruturação dos Hospitais Beneficentes já previa um modelo de remuneração denominado “orçamentação global” e, sem dúvida, este é o momento para se rever a forma de remuneração das instituições privadas de saúde, abandonando-se, mesmo que provisoriamente, a lógica de remuneração por unidade de serviço ou atendimento (pagamento por produção). Isto se faz necessário especialmente diante do cenário extremamente instável e grave delineado de aumento extraordinário dos insumos e materiais, notadamente os equipamentos de proteção individuais.

No modelo de pagamento por orçamentação global a um hospital beneficente (privado sem fins lucrativos) todos os valores recebidos comporão um valor fixo global, o que inclui todos os serviços de média e alta complexidade, considerando-se a série histórica conforme Portaria do Ministério sob análise, além dos incentivos como IAC, INTEGRASUS, dentre outros, além de recursos de fonte estadual e municipal. Vale a transcrição de trechos da Portaria de Consolidação MS/GM nº 02, DE 2017

ANEXO 2 DO ANEXO XXIV  

Diretrizes para a contratualização de hospitais no âmbito do SUS

(Origem: PRT MS/GM 3410/2013)

(…)

Art. 15. Para efeito deste Anexo, considera-se: (Origem: PRT MS/GM 3410/2013, Art. 15) (…)

II – orçamentação global: modalidade de financiamento na qual a totalidade dos recursos financeiros é provisionada ao contratado, garantindo-lhe conhecimento antecipado do volume máximo previsto para desembolso no período do contrato, podendo contemplar tanto recursos de investimento quanto de custeio, apresentados em planilha separadamente; (Origem: PRT MS/GM 3410/2013, Art. 15, II)

(…)

Art. 20. Quando acordado entre as partes, a contratualização poderá ser feita no modelo de orçamentação global, sendo que o repasse dos recursos será condicionado ao cumprimento das metas e compromissos formalizados, monitorados e avaliados periodicamente e que será calculada levando em consideração: (Origem: PRT MS/GM 3410/2013, Art. 20)

I – a infraestrutura tecnológica (porte, equipamentos e serviços); (Origem: PRT MS/GM 3410/2013, Art. 20, I)

II – o perfil assistencial; (Origem: PRT MS/GM 3410/2013, Art. 20, II)

III – a capacidade e produção de serviços (recursos humanos e desempenho de produção); e (Origem: PRT MS/GM 3410/2013, Art. 20, III)

IV – o custo regional de materiais e serviços. (Origem: PRT MS/GM 3410/2013, Art. 20, IV)

Outro fator preocupante que pode impactar drasticamente nos estabelecimentos de saúde é a falta de mão de obra, posto que, em média, 10% dos trabalhadores como médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem já foram afastados por pertencerem aos grupos de risco. Também ocorrerão de forma crescente afastamentos por contaminação destes profissionais, sendo que a experiência em outros países mostra que, em média, 10% deles são acometidos pelo novo coronavirus. Assim, o crescente investimento em equipe e novas contratações se fará necessário, o que repercutirá nos custos das instituições.

Diante de todo o brevemente exposto, registre-se outra constatação de absoluta relevância no que tange ao fato de que os hospitais não poderão reduzir seus custos com desmobilização de equipes diante da drástica redução dos procedimentos eletivos, de modo que o que se impõe nesta hora é uma verdadeira mobilização de equipes e estruturas para o enfrentamento desse “inimigo invisível”, que provoca danos imensuráveis e que vão muito além da esfera do indivíduo.

É certo que os gestores públicos e de instituições de saúde privadas necessitam ter um cuidado intenso e dinâmico com as unidades de saúde a fim de acompanhar a sua sustentabilidade, com atenção especial para o fato de que muitos dirigentes já iniciaram a escalada de gastos, não tendo, no entanto, recebido ainda nenhum recurso financeiro ou material de forma incremental. Assim, mesmo com o pagamento por orçamentação global e com a definição de metas mais apropriadas para o atual momento, novas iniciativas de recomposição dos repasses financeiros devem se realizar de forma contínua e com a urgência que a situação requer, contando, como é de se esperar, com a lisura de todas as partes envolvidas.

Recomenda-se, por fim, agilidade máxima nos repasses dos recursos, já que com o formato provisório de repasse por orçamentação global aos prestadores os recursos serão repassados aos fundos de saúde de forma fixa, independentemente de produção aprovada, o que se apresenta como nova realidade especialmente para os atendimentos da alta complexidade e financiados pelo FAEC.

Esforços conjuntos entre a gestão pública e privada é que serão o grande diferencial no nosso país para salvar mais vidas e evitar o colapso do nosso Sistema Único de Saúde.

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